Ele rumava na avenida dos desesperados.
De um lado da rua, num bufê, uma festa de casamento.
Do outro, um tumulto num bar. Saldo: dois mortos e
um ex-bar.
Continuou andando.
Olhou para a igreja, silenciosa, com uma imponente cruz
no alto do frontispício. Desviou-se, ali, de um bando de
góticos em algazarra com os olhos e os lábios negros.
Chamou-lhe a atenção a cruz branca, de ponta-cabeça,
estampada nas camisetas também negras.
Mais à frente, deparou-se com um maltrapilho com um saco
de papel e uma fatia de pão velho no interior.
-- Senhor, dê-me uma esmola -- o velho disse.
-- Tome 50 reais e coma um prato de comida num lugar
simples, pois, ali no shopping, os seguranças o impedirão.
E o velho se foi.
Sentou-se na praça mal iluminada onde alguns rapazes
encostavam seus carrões para inalar cocaína. Jogo rápido,
já que, num triz, saíam cantando os pneus... começo de
balada.
Nada mais o incomodava naquela noite. É só uma amostra.
É só a pontinha do iceberg -- pensou.
Tinha que regressar ao seu lar.
Não tinha dinheiro para o ônibus.
Percorreu 10 km a pé feliz com sua atitude.
Deitou-se e dormiu aliviado.
***