Nos longos dias que me restam,
Se bem que, a certa idade,
Eles parecem mais ligeiros,
Anseio a morte;
Mas só me lembro dos afetos
Que amiúde dei e recebi.
Lembro-me dos barquinhos
Que colocava nas enxurradas,
Lembro-me do canto da cotovia
No beiral do telhado,
Do meu rosto com sinais de barba,
Do meu rosto de homem feito,
E não das rugas e sulcos presentes;
Sempre quis tocar as estrelas...
Terei a chance de estar com elas
Sem podê-las tocar...
Vejo no espelho
Minha imagem irrefletida,
A imagem de minha aura:
Consigo ver um rosto,
Sinto ser o meu,
Mas não consigo precisar.
Nos longos dias que me restam
Vejo meus barquinhos chegarem ao mar,
Vejo uma cotovia... não é a mesma...
Vejo um rosto liso...
Velho é o meu olhar
Às estrelas, meu pensar;
Qual a última imagem que terei de mim
Nos longos dias que me restam
Se desejo a morte?
Qual a última imagem
Que terei no dia,
No meu último momento?...
Se for de meu julgamento
Quero, pela última vez,
Sorrir por sorrir, sem motivo
Nos longos dias que me restam;
A morte é só esquecimento,
Mas, no último momento,
Saberei o que foi minha vida.
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