Eu sempre - desde quando usava calção branco de algodão e me alegrava quando o
pipoqueiro apraecia lá na curva - eu sempre achei que a vida é uma estrada a lugar
nenhum. Fico até hoje meio coisado - pulando as poças d'água já com alguma dificuldade -,
mas ainda colhendo goiabas, jaboticabas, amoras, pitangas e assobiando pros passarinhos
seguirem meu canto. É... ainda não perdi esta mania de menino bobo. Ainda vou replantando
mudas de plantas frutíferas nas beiradas da estrada. E também desarmando as arapucas
dos caçadores de aves e animais silvestres. Tem algo dentro de mim que me diz que
nesta estrada darei meu último passo, mas não sem antes tomar um gole na nascente,
ali, atrás do Rancho dos Pescadores. Fico relembrando de quantas e quantas noites
sentávamos nos bancos de madeira para falar de tolices e de filosofia. Lógico,
com os jogos de baralho e cachaça amarelinha do Alambique do Zé Pedro.
Quantos já desapareceram na estrada que vai daqui para o além e perpassa
por todos os rincões do Brasil... Lembro-me bem do velhote, o Nhô Vicente,
que sempre me cumprimentava dando uns tapas no meu ombro esquerdo e me dizia
que 'a vida e o tempo fazem parte da estrada por que andamos.' Confesso
nunca ter entendido muito bem sua frase. Mas, hoje, adiantado na idade,
e repensando sobre minha existência - noto mais os detalhes de toda forma
de vida: o perfume das pedras, das flores, o detalhe de ver um pássaro com
uma haste de capim no bico, o murmúrio dos córregos, o vento assobiando
por entre as galhas das árvores, etc. Bom, neste momento estou no fundo do
meu quintal apenas olhando para a estrada e tirando água do poço e girando o
sarilho devagar. Eu sempre tive uma vida de desperdícios e tem coisas que jamais
entenderei, por exemplo: meu papel neste mundo, meu quintal, minha vida...são
os bens que possuo, e um terninho amarrotado que não me lembro de quando o
usei pela última vez. Ah, a estrada, embora hoje modificada e com menos de
um pouco de tudo permanece ali. Por ela um dia acharei minhas respostas. Penso
que sairei caminhando sem rumo e pouco a pouco meu corpo e minha sombra
irão se apagando, e ao fim dela não irei chegar. Sinto-me solitário como as moscas
que se nutrem de restos. Só sentirei a falta do meu quintal, das lesmas, e dos
pássaros anunciando o amanhecer.
***
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