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poema simplório à procura de um título que o embeleze e faça sentido, afinal o que vende é título

poema simplório à procura de um título que o embeleze e faça sentido


da versão de mim 
tenho aversão

melhor extremar
do que palpitar 
sem convicção

rio sem margens
povoa minha visão

ignorante
sou poço 
poça rasa
d'água barrenta
em ebulição
[com minha erudição não há quem possa]

me permito de mim
só a ficção

parece que vejo-me 
na vida dum herói de gibi
capaz de resistir a tudo

num tempo decrescente
corro manquitola
tal papa-léguas saci
....





***

Jaqueline.

Jaqueline morreu mocinha.
O pai dela há muito nas nuvens era inquilino
A mãe abandonara a casa e  perdeu-se na vida, iludida por um marujo,
e  ninguém soube mais  de seu paradeiro.

Só eu trago-os na memória e, depois de mim,
nossa história amical virará pó até parecer que nunca existimos...

Aqui, vagando à toa sem destino, lembrei que também fui menino.
Adorava meus pais tanto quanto Jaqueline, e chorava escondido,
até sem querer, pela incapacidade de pintar a vida do meu jeito.

Se os olhos são os espelhos d'alma e o pensar a alma dos olhos,
creio que não há nada de novo em mim, apenas sobrevivo com meus relances
sem entender por que a vida é assim...

Quando nem damos conta já estamos definhando no cenário mutante
que nos faz, simplesmente, artistas de um a peça só, onde os dias
é que contam nosso trajeto e, quando vem a saudade,
temos o que resta de nossa existência pra esquecê-la.

Algumas lembranças, sem querer, permeiam nosso imaginário
e nos enchemos de desmetáforas até perdermos as ilusões lunáticas
que nos incitam a continuar e, alguns ciclos vitais, aleatoriamente,
vão se apagando, tanto que nem me recordo mais o que me levava
ir a casa de Jaqueline e por que eles gostavam tanto de mim e eu deles.

Quando eu já era moço, descobri que nós dois éramos filhos adotivos;
descobri que ela foi meu primeiro amor e eu o dela. Uma de suas amigas,
anos depois, me entregou um caderninho com muitas declarações escritas
em coraçõezinhos sobrepostos.

Depois de tanta timidez e ingenuidade, depois de Jaqueline, meus amores
nasceram manchados de outros sentimentos, e o pilar do que eu sentia
virou um túmulo em que só  o orvalho adorna... As nossas casinhas, pareadas
no mesmo terreno, deram lugar a um grande edifício. Quando passo em frente
nem acredito que ali morei e ali  morou meu único amor, aprisionado dentro de mim,
imutável em noites que, quando garoto, eu acreditava ser eternal...



vida
uma vala estreita
de falhas e imprecisões
mas o que seria de mim
sem minhas ilusões


o que seria de mim
se meu eu-aviador alça voo
em cada percalço
e
se a cada queda livre
antevejo biombos
pulos e tombos
pra decolar
com tanto fim de mundo ao meu encalço


guardo na memória
dias que jamais voltarão
linhas de um novelo
hoje apodrecidas
as quais
amarrei o tempo

(ingênuo)

para que o amor
sim
inconteste
nunca fugisse de meu interior
rápido
como um 'delete'
de uma imagem inapagável

e
se este nobre sentimento
um dia se perder ao vento
que ainda eu o peneire
na velhice de minhas
relembranças
por vezes malvadas
tais
a visão de um rio
a arrastar tudo o que lhe cai à margem
...
talvez eu seja apenas um lago abissal
de aparente calma
capaz de tragar para dentro de mim
os risos triste/alegre
de idas primaveras

***
































sem sal, sem céu, sem sol



........




saio do fundo de mim mesmo
lá fora
a sufocante expressão dos sentidos
gente apressada e insossa
autômatos sem horizonte

sem sal
sem céu

sem sol
numa música de um só acorde

que me diz
"acorde

volte para dentro de si
cale-se

o garimpo é tortuoso
guarde tuas pepitas
além dos olhos nus"

o ceifador vai na frente
eu 
após
plantando minhas sementes
alheio às futilidades do tempo

sem sal
sem céu
sem sol

***