amarei as almas
na devassidão das noites
se melancólico estou
e a alegria delas
fere-me como açoites
amarei a vida
se a pessoa mais querida
fez-me alma sofrida
e se foi senil
sem se despedir
num lindo dia primaveril
amarei meus companheiros
se à boca pequena
são corvos matreiros
dentro da sujidade social
vivem de momentos
sempre se lambuzam
e da bondade deles
vejo excrementos
amarei as mulheres
numa mesa de pôquer
se só eu não sei
que as cartas estão marcadas
pro bobo-da-corte diverti-las
sempre amarei
saber-me o último da fila
pra ver o canto desesperado
a simplicidade no falar
do humilde não humilhado
amarei as alvoradas
os pássaros em revoada
a piracema da procriação
alguns homens ilustres
soldados da não-extinção
amarei a majestática porcão
que nem sei se faço jus
amarei a flux a fundo
o básico de cada cidadão
amarei poder amar
tão pequenas coisas
como o flerte
dum casal apaixonado edênico
despedindo-se à beira-mar
amarei o grito louco
meio ao ciclone
dum imprestável aventureiro
que bata às minhas costas
risque no chão a giz
pra onde aponta meu nariz
e me direcione aos poucos
resquícios de amares que me restam
nada se renova em minha memória
senão meu repúdio a fatos vis
outros que meu ideário cessam
digo que sempre amarei
pra poder dividir sem lei
poucas lições que me prestam
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